À primeira vista, a ascensão dos veículos autónomos parece ser uma adição bem-vinda ao transporte público.
Gigantes da tecnologia como a Waymo, uma subsidiária da Alphabet Inc., estão a promover os seus táxis autónomos como a solução ideal para problemas de mobilidade urbana. Os veículos já estão ativos em cidades como São Francisco, Phoenix e Los Angeles, e a Waymo anunciou recentemente uma nova promoção: os viajantes na área da baía de São Francisco podem obter até US$ 2,80 de desconto em uma viagem para paradas de transporte público selecionadas. Com esta campanha, a Waymo afirma que quer “tornar a mobilidade limpa mais acessível”. Mas por trás desta nobre mensagem parece haver uma história completamente diferente.
Superficialmente, parece atraente: veículos autônomos que melhoram o transporte público e apoiam os viajantes em comunidades ricas em trânsito. A Waymo enfatiza que o seu serviço, em combinação com o ciclismo e a caminhada, pode contribuir para uma mobilidade urbana mais sustentável. Para concretizar esta visão, a empresa nomeou até um novo diretor de política de transportes.
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Além disso, o grupo de defesa Câmara do Progresso pressionou os reguladores da Califórnia para aprovarem veículos autónomos, argumentando que a tecnologia pode proporcionar mobilidade a idosos, deficientes e residentes em áreas de difícil acesso. Esta abordagem parece fornecer uma resposta às carências financeiras que as empresas de transportes públicos enfrentam. No entanto, surgem questões críticas sobre o impacto dos robotáxis nos transportes públicos e as reais motivações de empresas como a Waymo.
Uma análise mais detalhada da promoção da Waymo revela advertências importantes. Por exemplo, como a Waymo sabe se um cliente que viaja para uma estação realmente transfere para o transporte público e não simplesmente recebe o desconto sem continuar no transporte público? De acordo com Adam Lenz, chefe de sustentabilidade da Waymo, a empresa atualmente não consegue fazer a ligação entre uma viagem de robotáxi e o uso real do transporte público. Essa tecnologia seria complicada e talvez também sensível em relação à legislação sobre privacidade. Ainda esperando Waymo que tais integrações serão possíveis no futuro.
Outro desafio diz respeito à implementação prática da promoção. Onde os passageiros são recolhidos e deixados? Algumas das estações mencionadas, como a estação West Portal do Muni Metro, não possuem locais designados para táxis ou serviços de carona como o Waymo. Isto poderia permitir que os carros estacionassem em fila dupla, o que não só dificulta o trânsito, mas também pode ser perigoso para os passageiros que precisam atravessar a rua rapidamente.
sem comoção
Apesar destes potenciais problemas, é pouco provável que esta promoção cause grande agitação nos transportes públicos. A razão? Mesmo com um desconto de 2,80€, poucos viajantes provavelmente se darão ao trabalho de combinar a sua viagem com um robotáxi. Esta falta de entusiasmo pelas viagens combinadas entre transportes públicos e táxis não surge do nada. Quando os serviços de transporte através de smartphones, como o Uber e o Lyft, se tornaram populares nas cidades americanas em 2016, houve um debate entusiasmado sobre a possibilidade de resolver o chamado problema do “primeiro quilómetro/último quilómetro”. Para testar esta teoria, a Administração Federal de Trânsito financiou cinco projectos que analisaram quantas pessoas estavam dispostas a utilizar estes serviços em combinação com o transporte público.
Os resultados foram decepcionantes. Em São Petersburgo, Flórida, onde os viajantes receberam um desconto de cerca de US$ 4,70 em uma viagem de Uber até uma parada de transporte público, uma média de apenas 40 pessoas por dia aproveitaram a oferta. Em São Francisco, um estudo de 2022 descobriu que apenas 0,4% das viagens na região eram uma combinação de transporte público e serviços de carona. As razões para isto são claras. As pessoas não gostam de fazer baldeação e quem já paga táxi provavelmente ficará no carro durante todo o trajeto para evitar complicações. Além disso, os custos de um Uber ou Lyft são muitas vezes demasiado elevados para o viajante médio de transportes públicos, que normalmente tem um rendimento mais baixo.
As pessoas não gostam de fazer baldeação e quem já paga táxi provavelmente ficará no carro durante todo o trajeto para evitar complicações.
Espera-se que os táxis autônomos enfrentem os mesmos problemas. Afinal, eles oferecem a mesma facilidade de uso (ou inconveniência) que Uber en Lyft, apenas sem o motorista humano. O conceito de chamar um carro para uma estação – seja um robotáxi ou um táxi normal – simplesmente não é prático para a maioria dos viajantes. Na verdade, um aumento no número de carros autônomos poderia prejudicar o transporte público.
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A investigação sobre a Uber e a Lyft mostra que estes serviços de transporte privado não só afastam os viajantes dos transportes públicos, como também contribuem para o aumento do congestionamento do tráfego através das chamadas “milhas mortas” – quilómetros percorridos sem passageiros no carro. Em cidades como São Francisco, os governos locais concluíram que estes serviços de transporte privado foram responsáveis por grande parte do aumento do tráfego entre 2010 e 2016. Isto está a ter um impacto negativo nos autocarros, que demoram mais tempo a viajar devido ao aumento do tráfego. Sem faixas exclusivas para ônibus, esses tipos de atrasos incentivarão cada vez mais viajantes a escolher o carro.
Os robotáxis, por mais sofisticados que pareçam, são basicamente apenas carros. Carros que, tal como os seus antecessores, fazem mais mal do que bem à cidade.
Contribuem para o congestionamento do tráfego, a poluição atmosférica e prejudicam a qualidade de vida urbana. É exatamente por isso que ativistas em São Francisco pararam os robotáxis no ano passado, colocando cones de trânsito laranja em seus capôs. Ao fazê-lo, protestaram contra a maior ancoragem do transporte orientado para o automóvel numa cidade que está a tentar reduzir esta dependência. Embora a Waymo se apresente como o novo parceiro do transporte público, esta adesão ao sector é principalmente uma jogada política inteligente. A empresa espera que a imagem positiva do transporte público ilumine a sua tecnologia de condução autónoma. Mas a realidade é que os robotáxis não ajudam o transporte público, mas prejudicam-no.